sábado, 15 de junho de 2013


O ensino da Escritura a respeito da relação entre Deus e a criação é singular entre as religiões do mundo. A Bíblia ensina que Deus é distinto de sua criação. Ele não é parte dela, pois foi ele quem a fez e a governa. O termo freqüentemente usado para dizer que Deus é muito maior que sua criação é a palavra transcendente. De maneira muito simples, isso significa que Deus está muito “acima” da criação no sentido em que é maior que a criação e independente dela.

Deus está também muito envolvido com a criação, pois ela é continuamente dependente dele para existir e funcionar. O termo técnico usado para falar do envolvimento de Deus com a criação é o termo imanente, que significa “permanecer em” a criação. O Deus da Bíblia não é uma divindade abstrata removida da criação e sem interesse nela. A Bíblia é a história do envolvimento de Deus com sua criação e particularmente com os seres humanos criados. Jó afirma que mesmo os animais e as plantas dependem de Deus : “Em sua mão está a vida de cada criatura e o fôlego de toda a humanidade” (Jó 12.10). No NT, Paulo afirma que Deus “dá a todos a vida, o fôlego e as demais coisas” e que “nele
vivemos, nos movemos e existimos” (At 17.25,28). De fato, em Cristo “tudo subsiste” (Cl 1.17), e ele está continuamente “sustentando todas as coisas por sua palavra poderosa” (Hb 1.3). Tanto a transcendência como a imanência de Deus são afirmadas em um simples versículo quando Paulo fala de “um só Deus e Pai de todos, que é sobre todos, por meio de todos e em todos” (Ef 4.6).  

O fato de que a criação é distinta de Deus e no entanto é sempre dependente de Deus e de que Deus está muito acima da criação e mesmo assim envolvido com ela (em resumo, que Deus é tanto transcendente como imanente) .  Isso é claramente distinto do materialismo, que é a filosofia mais comum dos descrentes hoje em dia e que nega igualmente a existência de Deus. O materialismo diria que o universo material é tudo o que há. 
Os cristãos de hoje que colocam o esforço quase total de suas vidas no objetivo de ganhar dinheiro e adquirir mais posses tornam-se materialistas “práticos” em suas atividades, ja que suas vidas não seriam muito diferentes se eles realmente não cressem em Deus.  

A narrativa escriturística da relação entre Deus e sua criação é também distinta do panteísmo . A palavra grega pan significa “tudo” ou “cada”, e panteísmo é a idéia de que tudo, o universo total, é Deus ou é parte de Deus.  O panteísmo nega diversos aspectos essenciais do caráter de Deus. Se o universo inteiro é Deus, então Deus não possui personalidade distinta. Deus não é mais imutável, porque, como o universo muda, Deus também muda. Além disso, Deus não mais é santo, porque o mal no universo também é parte de Deus. Outra dificuldade é que em última análise a maioria dos sistemas panteístas ( como o budismo e muitas outras religiões orientais) acabam negando a importância da personalidade humana individual: como tudo é Deus, a meta do indivíduo seria mesclar-se com o universo e tornar-se mais e mais unido a ele, perdendo assim a sua especificidade individual. Se o próprio Deus não possui identidade pessoal distinta e separada do universo, certamente não devemos nos esforçar para possuí-la também. Assim, o panteísmo destrói não somente a identidade pessoal de  Deus, mas também, de modo definitivo, a dos seres humanos.  

A narrativa bíblica também destrói o dualismo . Essa é a idéia de que tanto Deus como o universo material existem eternamente lado a lado. Assim, há duas forças supremas no universo, Deus e a matéria.  O problema com o dualismo é que ele indica o conflito eterno entre Deus e os aspectos maus do universo material. Deus triunfará de modo definitivo sobre o mal no universo?
Não podemos estar certos, porque tanto Deus como o mal certamente existem eternamente lado a lado. Essa filosofia negaria tanto o senhorio supremo de Deus sobre a criação como também o fato de que a criação veio a existir por causa da vontade de Deus, que ela deve ser usada unicamente para seus propósitos e que ela existe para glorificá-lo. Essa perspectiva também negaria que tudo no universo foi criado inerentemente bom (Gn 1.31) e encorajaria pessoas a ver a realidade material como má em si mesma, em contraste com a genuína narrativa bíblica da criação que Deus fez para ser muito boa e que ele governa para os seus propósitos. 
Um exemplo de dualismo na cultura moderna é a trilogia Guerra nas estrelas, que postula a existência da “força” universal que tem tanto o lado bom como o mau. Não há o conceito do Deus transcendente e santo que governa tudo e certamente triunfará sobre tudo. Quando os não-cristãos hoje começam a ficar conscientes da realidade espiritual no universo, eles muitas vezes se tornam dualistas, reconhecendo apenas que há aspectos bons e maus no mundo sobrenatural ou espiritual. 

O movimento Nova Era é na maior parte dualista. Naturalmente Satanás está se deliciando por haver pessoas pensando que existe uma força má no universo que talvez seja igual ao próprio Deus. 
A visão cristã da criação é também distinta da perspectiva do deísmo . O deísmo é a visão de que Deus não está agora diretamente envolvido com a criação. O deísmo geralmente sustenta que Deus criou o universo e é muito maior que ele (Deus é
“transcendente”). Alguns deístas também concordam que Deus tem padrões morais e por fim vai considerar as pessoas responsáveis no dia do juízo. Mas eles negam o envolvimento atual de Deus com o mundo, não dando assim espaço algum para sua imanência na ordem criada. Ao contrário, Deus é visto como o relojoeiro divino que deu corda no relógio da criação no início, mas depois o deixou funcionar por si próprio.  Ao mesmo tempo em que o deísmo afirma a transcendência de Deus, ele nega quase toda a história da Bíblia, que é a história do envolvimento ativo de Deus no mundo. Muitos cristãos nominais ou “mornos” são de fato deístas práticos, já que vivem longe da oração genuína, adoração, temor de Deus ou confiança contínua em Deus para que este cuide das necessidades que surgem.  

Autor:  Wayne Grudem.
Fonte: Teologia Sistemática do autor, Ed. Vida Nova

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